O médico precisa de viver…

Começarei hoje por vos dar um conselho de amigo: “Nunca queiram estar doentes”.      Porque – dizia o meu avô Jacinto, de Camarate – que “estar doente não é saudável.”  

Se ainda não sabem, ele tinha carradas de razão. 

Contava uma vez o Raul Solnado, que foi ao médico, e que este abriu o «Catálogo das doenças» e escolheu lá umas duas ou três para ele.

Desde então, a essência não mudou.    Em vez do tal catálogo, o médico procura no computador, e facilmente encontra lá as tais duas ou três doenças, para cada paciente que marcou consulta. 

Só que as doenças têm uns nomes mais sofisticados, que as nossas avós, ainda não conheciam, para aplicarem as suas abençoadas mezinhas.

No tempo das avós delas, era o “físico” que lhes fazia concorrência.     Hoje já não lhe chamam assim.    É o médico, para quem o Júlio Dinis cunhou uma figura, que nunca mais desapareceu da nossa linguagem: o “João Semana”.

Vejamos agora como chegámos ao médico, historicamente falando.

Recuemos até à vetusta língua indo-europeia original, da qual mesmo os entendidos sabem ainda muito pouco, mas o suficiente para afirmarem que dela derivam as principais línguas europeias.

Nessa língua existia a raiz MED, que, ao que parece, tinha o significado de “pensamentos equilibrados”.

Encontramos a sua expressão na MEDitação, por exemplo.

Para chegar à meditação, e a meditar, serviram-se os latinos de outra raiz indo-europeia, IES (movimento rápido), que deu o verbo iasthai, que significava dar forças.

Med + isasthai deu medesthai, pensar sobre o assunto, concentrar-se, aconselhar.    O sujeito da acção em latim era o meditor, o que sabe, está ao corrente, está consciente.    Daí meditar, e meditação, no sentido corrente que lhes damos hoje.

O passo decisivo de acalmar, aplacar, amenizar, consolar, tudo isto componentes da ideia de curar, traduzia-se no verbo medeor. 

O agente da acção era o medeorcus, que, com o tempo, se simplificou em MÉDICO.

 Portanto, não tinha razão o Raul Solnado, não senhor.  Os nossos médicos  não se limitam a consultar o «Catálogo das Doenças».    Eles analisam os nossos sintomas, pensam com tudo quanto aprenderam, qual a causa dos nossos males, e receitam-nos o melhor remédio para os aliviar, eliminando as causas.    E quase sempre conseguem.

O que o meu “avô” Jacinto queria dizer, na sua lógica simples de pedreiro, é que os remédios curam umas doenças, mas por vezes provocam outras.

Conheci um sujeito que, quando a mulher o obrigou a ir ao médico, obedeceu, trouxe a receita, foi aviá-la na farmácia, e, quando chegou a casa, à vista da mulher, deitou os remédios todos na pia.

 E explicou: “Fui à consulta, porque o médico precisa de viver. Aviei os remédios, porque o farmacêutico precisa de viver.  E então eu? Não preciso de viver também? Vai tudo para a pia, mas não para o meu corpo!”

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