Arquivo de Janeiro, 2008

Tâmaras na palma… da mão

“Ai Mouraria, da velha Rua da Palma…!”  “Reza-te a sina nas linhas traçadas na palma da mão…” 

Em que ficamos? Palma, de palmeira, ou palma das mãos?

Como já deram por isso, se é a mesma palavra, deve ter andado em bolandas na história. 

Pois a verdade é que a mesma palavra nasceu em latim, “palma”, com o significado de “mão”.    Por extensão, como os ramos das palmeiras pareciam estender-se como os dedos da mão, foram esses ramos chamados, ainda em latim, “palma”.  (“Domingo de Ramos”, em inglês, é “Palm Sunday”).

Foi esta acepção botânica a primeira a chegar às nossas línguas, através dos diversos dialectos germânicos – “palma” = ramo da palmeira.

A outra accepção, na realidade a original em latim, como vimos, a da parte da mão, em forma de concha, chegou-nos pelo francês “paume”.

Mão” veio também do latim “manu”.

O uso da mesma palavra para a mão e para o ramo da palmeira já vem de longe. Na língua hebraica, “Kaf” (plural “kapot”) é tanto a “palma da mão” (ou do pé), como o ramo da planta que aqui nos brinda com as deliciosas tâmaras (do hebraico “tamar”).

Ainda no hebraico, e por extensão, qualquer objecto cuja forma lembre a palma da mão, é “kaf” – “caf” é “colher”, e também “pá”.

O membro superior do corpo humano (“braço” em português, é, em hebraico, “yad”.  O membro inferior (a “perna”) é “reguel”.

Portanto a “palma do braço” é “kaf ha-yad” e a “palma da perna” é “kaf ha-reguel”.

Voltando ao nosso português, temos ainda muitos derivados do latim “palma”, desde “palmiforme” (em forma de palma), como o verbo “palmar”, ou seja apanhar com a mão.

E temos também o “palmo” – medida da extensão que vai da ponta do polegar à ponta do mínimo, estando a mão bem aberta. Medida de 0,22 m. 

O homem e a maçã

Uma história curtinha, de que me lembrei hoje, ao fazer mais uma tentativa para catalogar a minha biblioteca.

“Maçã-de-adão” – todos sabemos o que é: aquela cartilagem saliente, que todos temos no pescoço, através da qual se processa também a fala.

Mas porquê “maçã-de-adão”?Por duas razões:

– A primeira baseia-se na lenda popular que conta que quando, no paraíso, Eva convenceu o marido a provar o fruto da árvore da ciência do bem e do mal – supostamente uma maçã – Adão deu uma dentada e engasgou-se, porque o bocado que engoliu ficou entalado na garganta, no lugar onde está a dita cartilagem.

A segunda explicação, científica, é que o crescimento da cartilagem é determinado por hormonas masculinas, sobretudo a testosterona.  Como só nos homens se encontram essas hormonas em quantidade, sobretudo na puberdade, é nos homens que a saliência é mais pronunciada.   E quanto mais altos, mais pronunciada.

Daí o nome de “maçã-de-adão” – e não de Eva.  

Aventuras do tabaco

O Isidoro, aluno da primeira classe, contou na aula que tinha um vizinho novo, o senhor Mindonça.  O professor, que ouviu a conversa, emendou-o: “Não é Mindonça, é Mendonça, que se diz”.  O Isidoro insistiu: “Desculpe, mas o meu vizinho é Mindonça. Sempre que o meu pai vai à rua, ele pede-lhe: ‘Faça-me um favor, senhor Lopes, traga tabaco para mim d’onça!”

Vocês já não são do tempo da onça de tabaco e do papel para cigarros, que se comprava nas tabacarias, e depois se enrolava e fechava com cuspo, para fumar.  Até vai um “gadget” (como se diria hoje) para fazer o cigarro à mão e sa´´ia mais direitinho.   Nem do rapé e das caixinha de rapé. tabaco para cheirar.  Ainda hoje se coleccionam essas caixinhas, algumas de prata e muito artísticas.

Pois o meu “avô” adoptivo Jacinto, de Camarate, pedreiro de profissão, costumava dizer que no inverno  “não ganhava para o tabaco.”

O tabaco e o seu fumo estão agora nas bocas do mundo. 

Fumar ou não fumar em lugares públicos?

Direito dos “fumadores passivos” a proteger a sua saúde?

Direitos dos fumadores activos a desfrutar livremente do seu vício?

Nenhuma destas perguntas se situa no âmbito deste cantinho de conversa.

Mas que dá oportunidade para algumas histórias, ah isso dá! 

O tabaco é originário do Novo Mundo, sobretudo da América do Sul, e foram os espanhóis e os portugueses que o trouxeram para a Europa, ao mesmo tempo que o seu uso e a maioria das palavras com ele relacionadas.

O fumo do tabaco começou por ser um acto sagrado entre os índios das Américas.  Circulam entre eles muitas lendas sobre os espíritos que trouxeram essa tradição para os seres humanos.  A mais consistente em diversas regiões é a do Grande Espírito, que reuniu o povo num alto precipício, de paredes de quartzo, e, partindo um pedaço da rocha vermelha, construiu o primeiro cachimbo.   Foi com base nessa lenda que se iniciou a tradição dos índios fazerem peregrinações â Rocha Vermelha dos Cachimbos, e lá construir o seu cachimbo sagrado individual com a pedra daquela rocha..

A palavra cachimbo, que usamos em português, veio da língua africana bundo, ou quimbundo (Angola), na qual o cachimbo se dizia “quixima”.

Tabak era uma palavra da língua caribe, falada pelo povo Caribe, habitante das Caraíbas. Na sua língua “carib” significava “inteligente”. 

Não se sabe ao certo se eles chamavam “tabak” ao cachimbo, se às folhas da erva do tabaco, enroladas como os cigarros, para fumar.

Na língua maya o tabaco chamava-se siyar ou sikar.  Daí recebemos a palavra “cigar”. Para o português ficou cigarro.  Para os ingleses, “cigar” é o que nós chamamos “charuto” . Os ingleses têm um tipo de charuto, com as duas pontas cortadas, a que chamam “cheroot”, nome derivado de “shuruttu”, na língua tamil (Sri Lanka, ou Ceilão, como se chamava a ilha no tempo em que eu estudei. Agora andas os tamils revoltados, desejando a independência).

Dizem os contadores de histórias que no século XVIII, em Sevilha, os mendigos começaram a apanhar do chão as pontas dos cigarros, que os “meninos ricos” deitavam fora.  E então enrolavam esse tabaco em papel, chamando-lhes “cigaretas”. 

Daí adaptaram os ingleses a sua palavra para os cigarros, que depois foi seguido no francês e no alemão, com grafias diferentes – “cigarette”, ou seja um charuto pequeno. ~

O nome científico da planta do tabaco é, como sabem Nicotiana tabacum.

O produto activo do alcatrão, que “adorna” as paredes dos pulmões dos fumadores inveterados, chama-se “nicotina”.

Foi seu padrinho o médico francês Jean Nicot, que usava o tabaco como medicamento, para minorar as enxaquecas de Catarina de Médicis., rainha de França.


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